O game original Crisis Core é o meu game favorito na plataforma PSP. Em 2007, ele cheirava a jogo premium numa plataforma que normalmente deveria estar rodando jogos mais modestos. Na véspera de Natal, Reunion é um título mágico que retorna de um jeito que todo remaster deveria retornar.

Não é a primeira vez que a gente ganha um Final Fantasy aclamado e exclusivo de PSP. Na era PS4 e pré-Final Fantasy XV, a Square Enix soltou um remaster de Type-0 e aposto que você tinha esquecido deste título. Type-0 era uma obra exclusiva ao Japão nos tempos de PSP e até ganhou tradução de fãs ocidentais, mas ao contrário de Crisis Core Reunion, ele não trazia tanta mudança técnica e acabou soando mais como um port retardatário para o PS4.

Porém o que Type-0 não possui, apesar de ser um bom jogo, é um jogo parente, para fazer com que ele esteja em berço privilegiado, e assim Crisis Core é. Uma prequel de Final Fantasy VII que deveria vir com um lencinho para enxugar suas lágrimas, pois trata-se de um pacote cheio de emoções a la moda da casa japonesa, mesmo sendo um RPG de ação.

E é verdade sim que a jogabilidade é uma mistura de Kingdom Hearts na batalha e Final Fantasy VII nos menus. A batalha do game é justamente um protótipo da ação em Final Fantasy XV, e não é de se espantar o fato, pois ambos os jogos trazem como diretor o Hajime Tabata.

Mas dando mais dois passos atrás, vamos ao plot da trama, que talvez seja o maior motivo para se (re)jogar Crisis Core: Zack faz parte da SOLDIER, a solução militarizada que a Shinra adotou para manter a ordem e paz entre os cidadãos de Midgard. E quando dizemos paz, queremos dizer que a classe pobre fica quieta nos escombros da cidade, enquanto no alto da pizza gigante, a vida corre normalmente para os privilegiados. Sim, é uma cidade industrializada, que se desenvolveu em volta da geradora de energia Mako, a queridíssima Shinra.

Obviamente, os cidadãos das favelas precisam limpar o vômito e cocô das pessoas de classe mais alta, ou seja, aquelas que estão literalmente na parte alta da cidade. Mas não tema, pois para que isso seja feito, o transporte público de baixo para cima funciona muito bem. Mas roteiros socialistas de Bioshock a parte, voltemos ao Zack.

Como um SOLDIER, ele respira o seu dever, como tantos outros ali dentro, e não é novidade que todos visam subir de cargos. Zack é obviamente um forte aspirante a isto. Na verdade a gente o encontra já em um cargo privilegiado, se quer saber. Crisis Core então fala um pouco sobre estar ingenuamente do lado do inimigo, e ver aos poucos que estar perto de seus ídolos e perceber que muitas vezes não é a sensação que visávamos. Dentro disso tudo estaremos envolvidos em guerras, do lado errado, claro, assim como sentir o choque de sociedades.

Uma das críticas que li afora é de que “embora seja um dos melhores exemplos de remaster, Crisis Core essencialmente é o mesmo jogo de PSP”. E não sei por que isso tiraria o mérito do título, pois nada a mais fora prometido, não é como se a gente estivesse recebendo uma iteração parecida a cada ano.

Como proposta, o jogo traz a parte visual em texturas e iluminação totalmente refeitas, ao contrário de 95% dos jogos que levam o nome “remaster” no título, pois normalmente só aumentam a resolução, pare serem aproveitados nas TVs de hoje em dia. Além disso, a performance é movida de 30 para fluídos e fixos 60 quadros por segundo (exceto na versão Switch, que mantém os 30 fixos). Como esse título específico se trata um RPG com batalhas de ação, a fluidez de movimentação ajuda muito na experiência.

Agora, como um Final Fantasy, a estrutura de Crisis Core é um pouco diferente. Primeiro, é que não existe uma party. O jogo prefere reforçar o carisma de Zack Fair, narrando sua jornada profissional e emocional que leva ao início de Final Fantasy VII. A jogabilidade é uma das coisas mais diferentes falando-se em estrutura de jogo. Se você segue o modo história, andará apenas um pouco pelos mapas, que são pequenos, e pequenos o suficiente para dar uma sensação de progressão territorial.

O objetivo da campanha não é de jogar muitos inimigos em cima do jogador, mas sim de conta a história em forma de diálogos em cutscenes. Muito embora os personagens nos cenários agora serem dublados, todos, ao contrário do jogo original de PSP, é claro como se vê que a progressão é feita puramente em prol da narrativa. Existe um número de oponentes em batalhas durante sua caminhada, mas não é nem perto do volume apresentado em outros jogos da série, onde os encontros não são opcionais também. Pois então, onde vamos ficar fortes para enfrentar os poucos inimigos obrigatórios no caminho?

Embora muita honra e orgulho estejam envolvidos, Zack ainda é um empregado e têm acesso a afazeres, que na verdade serão missões abertas gradativamente no menu do jogo, junto do equipamento, Materias, etc. Através dos e-mails recebidos em seu celular flip (em 2007 eles ainda eram sucesso!), Zack pode entrar instantaneamente em curtas missões, organizadas em vários tópicos, parecendo alguma coisa que vemos nos Monster Hunter clássicos.

Essas missões lhe levam a mapas variados e reaproveitados da campanha principal, só que dentro de pequenas dungeons com alguns encontros aleatórios. O objetivo quase sempre é chegar ao oponente principal daquela missão e derrotá-lo. Podem ser os soldadinhos mais buchas da Shinra ou summons querendo briga pesada. Tudo isso ajuda o seu personagem a ganhar itens e materias valiosas, assim como subir de nível.

São missões tão curtas como uma balinha retirada de seu bolso, exatamente do tamanho de um jogo portátil, onde você acessa as partes que não requerem nenhuma atenção em parte da narrativa, deixando as partes mais importantes para serem jogadas em casa ou em outro ambiente onde tenha foco para jogar a história do jogo. Isso é um design para jogo portátil, muito bem pensado, que agora pode ser jogado em consoles grandes também. Não se sente que esse jeito de ser atrapalha a experiência, uma vez que o jogador entende-a. Porém se o jogador chegar em Crisis Core desejando e comparando a coisas clássicas Final Fantasy, poderá desenvolver um perigoso preconceito, ao menos da parte de jogabilidade.

Da parte de batalhas, foram desenvolvidas muitas melhorias de vida e controles para Crisis Core. Isso resulta em leituras mais precisas do que o seu inimigo está prestes a fazer. O resultado dessas melhorias impede bastante o que acontecia comigo no jogo original no portátil: um jogo com batalhas caóticas e botões pressionados a esmo, quase sempre sem preocupação com as minúcias da batalha. Agora, neste remaster é possível ler ataques para se preparar para defesas ou esquivas.

O jogo original serviu de base para gameplay de batalhas em jogos Final Fantasy posteriores, mesmo que eu sinta que Crisis Core herde resquícios da batalha de Kingdom Hearts. Final Fantasy XV abraçou o caos e acabou sendo totalmente sobre batalhas bagunçadas, mas realmente sente-se que Reunion repara isto. Outras mecânicas ligadas à batalha, são totalmente pegas de Final Fantasy VII, como o sistema de materias. Podemos até fundir umas com as outras para obtermos versões mais fortes ou elementais diferentes a partir da mistura original.

Outras coisas, que são até controversas, continuam aqui no jogo. Talvez a principal delas é o sistema de roletas dentro da batalha. Existe um slot machine que fica infinitamente girando e exibindo seus resultados, a cada 5 ou 7 segundos mais ou menos. Quando alguma figura se alinha, Zack é beneficiado imediatamente na batalha. Summons, por exemplo, não podem ser invocados a vontade, com um comando. É preciso que haja o alinhamento da figura de summon correspondente e aí sim você terá a opção de pressionar um botão para chamá-lo.

Outras figuras são colegas de trabalho, que quando alinhados podem chegar para emprestar um bombardeio de helicóptero ou fazer você lembrar de algum ataque especial uma vez ensinado (de Sephiroth, por exemplo). Algumas matches nesse slot podem trazer pequenas cutscenes também, que ajudam a subir barras de nível para cada especial (sim, quase tudo neste jogo terá níveis, mesmo que sejam barras de 3 estrelas no máximo). Na batalha então, de livre escolha em menu ao vivo (assim como em Kingdom Hearts), temos os itens, golpes físicos especiais e magias, fora os movimentos básicos de ação em campo, claro. O intuito da slot machine é de apoiar e jogar temperos na ação da batalha, deixando você se sentir muitas vezes como o SOLDIER imponente que a narrativa pinta.

Agora de volta a narrativa, a trajetória de Zack soa energética inicialmente, justamente como a personalidade deste SOLDIER, mas vai se tornando cada vez mais amarga e emocional conforme ele tem seus olhos abertos. O jogo trabalha bastante com a premissa de encontrar com personagens e referências posteriores no Final Fantasy VII, então é recomendável que o jogador tenha jogado este título previamente ao Crisis Core, se quiser se ater emocionalmente muito mais na narrativa.

Jogar o Remake de Final Fantasy VII também vai funcionar – não tão bem por se tratar de uma história ainda incompleta. Mas é possível sim ainda se encantar com o jogo sem ter consumido nada da franquia ou do universo VII.

Nota
Geral
8.5
crisis-core-final-fantasy-vii-reunionFinal Fantasy VII: Crisis Core Reunion é um jogo que se liberta do PSP finalmente. O portátil da Sony detia um dos melhores spin offs Final Fantasy e agora vemos que a Square Enix trabalha bem quando quer. Tendo lançado quase 40 títulos em 2022, pouquíssimos receberam atenção e elogios. Logo, Reunion encerra em grande estilo o ano da mais notória produtora de jRPGs do mundo.