Talvez a maior dúvida de uma pessoa hoje ao estar na boca do caixa decidindo se compra Black Myth: Wukong ou não,  é do quão esse jogo pode fazê-la de p*tinha. E veja bem, não quero começar sugerindo tais temas chulos com tanta gratuidade. Só quero relembrar de relance o dia que John Romero estampou numa capa de um jogo que o mesmo iria “fazê-lo dele a sua p*tinha”.

Isso denota que estamos falando do nível de desafio da obra e temos aqueles indivíduos que querem que justamente isso aconteça e temos aqueles que se atraíram pela proposta rezando para que pouco do jogo do macaco tenha a ver com jogos da From Software.

Vamos falar da China

A importância de Black Myth precisa ser explorada, ao marcar a outra face da China quando estamos falando de jogos. Antes, lembrada como um país que, por conta de seu governo, via uma cena de jogos muito ultrapassados, dos tempos de Nintendinho, sendo comercializados. Muitos desses eram modificados no próprio país, mesmo não tendo direitos para isso. Porém, como os consoles oficiais da Nintendo, por exemplo, não eram comercializados, muito menos consoles do país-mãe do capitalismo se tornava algo como “terra de ninguém”, só que em “um país para todos”.

Hoje as coisas são muito diferentes, mas a predominância de jogos de cunho social, o tipo daqueles que permeiam os e-sports seguem sendo a base daquele país inteiro quando sequer tocamos na palavra “games”.

Porém, de alguns anos para cá temos visto tentativas quase tímidas de jogos mais tradicionais modernos, como, por exemplo, F.I.S.T. Forged in Shadow — um ótimo game. São jogos singleplayer, que nos dão um gosto da cultura local de um jeito ou de outro, e perspectivas frescas, mesmo que sejam dentro dos mesmos tipos de jogos de sempre (em sua maioria os character action).

Você poderá se transformar em espíritos de alguns inimigos caídos.

Estruturalmente falando

Foi muito difícil de não se convencer de que Black Myth Wukong não seria um jogo ‘souls’ durante a sua campanha de marketing, mas, ao mesmo tempo, podemos dizer que existem vários elementos empregados que são heranças daquele tipo de jogo.

Black Myth conta com pequenos santuários de beira de estrada para podermos organizar nosso inventário, comprar e vender, equipar, subir de nível e descansar. Essa última opção faz com que inimigos “bucha” reapareçam no cenário, servindo de fonte para um certo grinding, que deverá ocorrer cedo ou tarde.

Felizmente por isso, os atributos são bem pragmáticos em suas funções, e embora o jogo requira reflexos por parte do jogador, a dificuldade pode baixar grandemente se você está com uma nova arma comprada, o personagem bem equipado e upado, etc. Por esse motivo, jamais deixe de explorar o pouco explorável de Wukong. Talvez isso venha em forma de surpresa para alguns, mas podemos afirmar que em suma, o game é praticamente um “boss rush” (característica de jogo, que é composto majoritariamente ou integralmente por batalhas contra chefes).

O pouco de área que existe entre uma grandiosa batalha e outra, quando há, pode esconder, de forma esperta, pequenas entradas para lugares com bosses simplesmente não obrigatórios, mas que ignorar esses desvios pode significar batalhas mais desafiadoras adiante.

O jogo não economiza em momentos calculados de beleza

O loop de gameplay

Eu mesmo, dando como garantido que o jogo é 100% linear, derrotei alguns dos primeiros bosses, forte de corpo, sim, mas fraco de arma, armaduras e outros segredos. Confesso que foi libertador saber disso e observar outras pessoas jogando as mesmas partes e vencendo as batalhas de forma muito mais fácil por seguirem com equipamentos que o jogo dava a exploradores. Isso me deu confiança de prosseguir na montanha e além, não achando mais Black Myth Wukong um jogo intransponível para uma pessoa como eu que se acha tão não talentosa no gênero souls. Por outro lado, não quero dizer que o jogo possua 30% ou mais de exploração, pois a minha sensação é de que temos menos que isso – exceto no sexto e último capítulo.

Agora partindo para o combate ferrenho, o pilar principal do game, posso afirmar que se trata de algo frenético como um jogo inspirado da Platinum, que você terá que jogar com a agressividade de Bloodborne. Sim, Black Myth tem muitos recursos de gameplay no combate, mas parry e defesa como sendo algo padrão, não existe. Cair de cabeça no redemoinho do caos e por vezes dança sincronizada que é o combate contra chefes é o melhor jeito de abordagem, invés de algo passivo. Por eu mencionar dos shrines de descanso e os inimigos revivendo, talvez intimide você, que pode estar achando que temos aqui algum sistema de corpse run, o que não ocorre. Ao perecer, você não perde seu “XP” coletado. Você retorna ao checkpoint.

Então uma dificuldade que pode ocorrer é que você precisa de energia de HP cheios e curas aos montes ao tentar mais uma vez derrotar determinado chefe, mas a caminhada até ele pode conter inimigos que podem atrapalhar esse seu plano de chegar tinindo na briga colossal. A partir deste momento, correr direto para o chefe, sem olhar para trás é a opção, mas você pode simplesmente usar inimigos normais como treino e farming — você que sabe.

As batalhas requerem que você repare nas deixas de cada chefe (os chamados “tells”), e com isso, se faz necessário aprender o repertório inteiro de ataques de seus inimigos até que não hajam mais surpresas. Isso lembra bastante algum tipo de filosofia kung-fu, do aprendiz que erra incansavelmente até ficar inabalável – ou quase, não tem problema. O que quero dizer é que se você se frustra com um jogo que não flui suavemente no progresso, como um filme.

Talvez seja muito tarde para falar sobre isso depois de tantos anos agora tendo o retorno dos jogos realmente desafiadores, mas eu sei que posso estar falando também com o público que não cresceu com isso e encara videogames como uma experiência com atritos artificiais. Black Myth  Wukong pode ser muito bem a sua porta de entrada para a paixão em jogos com desafios reais, ou pode ser a sua porta de saída ao renegá-lo e seguir em frente com jogo narrativos e de ação cinematográfica.

Banquete [visual] na montanha e além

Falando nisso, a parte visual, o qual é o que se destaca imediatamente desde o primeiro anúncio, não se resume a somente força bruta, devido à Unreal Engine 5. Apoiado no conto “Uma Jornada Para o Oeste”, do qual se baseiam Dragon Ball, Enslaved: Odyssey to the West, e tantas outras obras, Black Myth não economiza em criatividade visual, sendo assim um dos fortes candidatos a jogo com melhor direção artística de 2024. Inicialmente, subamos uma verde montanha, mas não é um verde que vemos sempre em jogos. Não estaremos em zonas tropicais, savanas africanas ou pastos  americanos.

O misterioso verde musgo da densa e super úmida floresta se contrasta com o sol tímido e compartilha reinos entre nuvens ao horizonte. As outras áreas vão entregar o que você esperar que um jogo com estruturação um pouco mais tradicional entrega: são áreas áridas ou nevadas, por exemplo, sem muito espaço para interiores, onde muitos level designers e artistas se aproveitam em jogos para dar um descanso em seu árduo trabalho. No game do macaco, a natureza é sustentada do começo ao fim, algo corajoso de ser aplicado em qualquer jogo moderno.

Calcule o nível de complexidade dos efeitos da Unreal 5

Esse trabalho árduo também não significará que estamos falando de um jogo curto. Em média você poderá terminar Black Myth: Wukong na décima terceira hora, mas os pequenos pontos de exploração podem estender um pouco isso.

Voltando à exploração, talvez essa seja uma parte que me frustra no game, talvez, eu confesso, por manter as expectativas incorretas. Todavia, eu daria em troca de alguns chefes deixados de fora, alguns momentos mais intensos na parte de exploração.  Isso tudo e não faz com que estruturalmente o jogo seja muitíssimo simples, restando ao jogador, ser resiliente em suas ferrenhas batalhas.

Essas batalhas por momentos deverão lembrar o escopo exagerado de animes ou do game Asura’s Wrath, sendo engraçado que esse tipo de comunicação com o espectador/jogador é mantido, mesmo que não estejamos falando de um jogo japonês. Espere por inimigo mitológicos e deuses e talvez aí more a única similaridade com God of War que tanto comparam quando falam desse jogo. Então, não, eu não acho que Black Myth Wukong seja um jogo similar a God of War de 2018 em muitos parâmetros.

Nota
PONTUAÇÃO GERAL
8.0
black-myth-wukongBlack Myth: Wukong oferece um showcase visual e de ação ao apresentar sequência a sequência incessantes batalhas contra chefes, deixando pouco espaço para exploração. Todavia, estabelece que a China não está para brincadeira quando o negócio é sobre cativar o coração dos jogadores mais tradicionais.