A loucura cobriu a sombria Londres da era vitoriana. Repentinamente, tal qual um mistério de alguma novela dos anos 1980 do Aguinaldo Silva onde não existe muita explicação para tal, habitantes de londres começaram a gritar apenas uma palavra: “Morra!”. Mas calma, há explicação!
Combinando o combate de Darkest Dungeon, com uma inesperada mecânica de gerenciamento de circo e uma pitada de romance visual, Circus Electrique é o novo lançamento da Zen Studios que chega para todas as plataformas de consoles e para PC.
Uma premissa instigante
A ideia de uma Londres ‘Steampunk’ alternativa desperta seu interesse? E se adicionar uma pitada de mistério com pessoas comuns repentinamente tornando-se assassinos cruéis pelas ruas da maior cidade do Reino Unido? Tudo isso é unido partindo do ponto em que você administra um Circo que tem como missão produzir todas as noites o maior espetáculo que aquela cidade, que está em um verdadeiro caos, pode encontrar. Sem dúvida é uma história bastante promissora e que lhe faz se sentir no objetivo de ir a fundo nesse mistério para encontrar respostas para suas indagações.
No centro da história está a jovem jornalista Amélia, que se encontra trabalhando na reabertura do Circus Electrique, que pertence ao seu tio. Com um olhar sedento por sangue, as pessoas começaram a se matar e por muito pouco, Amélia não foi morta. Ela foi salva por artistas de circo liderados por seu tio. O que está acontecendo e, mais importante, como lidar com tudo isso e gerenciar um grande espetáculo, é o que temos que descobrir em aliança com os artistas.
Na apresentação da trama, há uma explícita semelhança entre Circus Electrique e um visual novel – porém, não é possível escolher as opções de resposta nos diálogos. Desde as primeiras linhas, a dor de Amelia nos é transmitida. A jovem tem uma profunda decepção com tio e o culpa pela morte de sua mãe.
Em meio a isso tudo, além da missão principal, ainda temos que lidar com os sentimentos da heroína. Embora a história não pretenda ser um primor narrativo, ela se tornou um esqueleto para todo o jogo, e foi o meu maior incentivo a terminá-lo. Eu adoraria contar um pouco mais sobre a história de Circus Eletrique aqui nesse texto, mas iria estragar completamente o jogo para você.
Hoje tem RPG? Tem sim senhor!
Os fãs de Darkest Dungeon verão muitas mecânicas familiares em Circus Electrique, em particular, o combate é quase inteiramente copiado desse já clássico roguelike. Ou seja, é um combate tático e também baseado em turnos, onde os membros de um esquadrão de 4 lutadores (todos artistas de circo), entrarão em uma batalha perfilados um após o outro.
Cada personagem tem seu próprio conjunto de habilidades e tem um indicador semelhante de “estresse” e “lealdade”, o que faz com que as batalhas se tornem um pouco mais difíceis, já que com o decorrer do jogo, você precisa se lembrar dos efeitos negativos e positivos, bem como a posição dos lutadores. Um erro repentino ou dano crítico pode resolver o resultado de uma batalha de uma hora pra outra.
Em geral, Circus Electrique pode assustar o jogador menos hardcore olhando assim de longe, mas neste caso, os desenvolvedores permitem que você escolha entre níveis de dificuldade fácil, médio e alto. Ou seja, caso queira apenas acompanhar essa história interessante sem se preocupar muito com o combate, é só selecionar a dificuldade mais baixa.
O fato novo em Circus Eletrique é exatamente a sua premissa que brilha logo de cara devido o fator carisma. Aqui nós não administramos um acampamento e saímos para lutar usando mercenários implacáveis com lâminas e fuzis, em Circus Eletrique nós batalhamos com os artistas de circo comuns, aqueles mesmos que já estamos familiarizados e aqui está muito bem estereotipado: palhaços gordos, homens fortes de bigode, malabaristas, domadores de fogo e outros artistas. Existem 15 arquétipos de personagens no Circus Electrique, o que definitivamente tornará possível criar um esquadrão heterogêneo e ideal.
Os desenvolvedores poderiam ter feito do Circus Electrique um jogo chato, destacando a mecânica das batalhas e enviando o jogador para limpar monotonamente Londres de vários vilões. Esta parte da jogabilidade está aqui, e não há nada de interessante nela. Andamos pela cidade ponto a ponto, tropeçamos em batalhas ou eventos aleatórios, às vezes nos divertimos em minijogos e desfrutamos de baús com objetos de valor, e no final do local, enfrentamos o chefe.
O jogo brilha de verdade e se torna muito mais atraente nos eventos que acontecem entre as batalhas. Todo o circo se torna nosso refúgio, onde você pode contratar novos artistas, criar algo com os itens encontrados, enviar um soldado ferido para a enfermaria e administrar o nosso circo. Esses “setores” do circo podem ser atualizados e receber vários bônus, e é aí onde a parte de gerenciamento de Circus Electric brilha de verdade.
Respeitável público
Além de batalhar, contratar artistas para lutar e acompanhar a história, é claro que você precisa conduzir da melhor maneira possível o real motivo da existência de um circo: o seu espetáculo. Todos os dias, antes da batalha, temos que fazer uma apresentação. Isso não é feito em apenas um clique, ou de forma automática, pois existe um monte de pequenas mecânicas: você precisa escolher um tipo de espetáculo, decidir sobre os protagonistas e coadjuvantes (e saiba que os personagens podem ser amigos ou terem conflitos entre si, o que também afeta o resultado do show ), alocar recursos para alcançar o resultado desejado e muito mais… A gestão do espetáculo do circo é uma parte incomum da jogabilidade que faz com que Circus Electrique se destaque, embora fique chato rapidamente.
Você pode descobrir os resultados da performance no jornal da noite, onde os jornalistas escrevem na coluna se o público ficou encantado ou se aqueles sentados em casa no sofá não perderam nada por não virem até nós. As críticas acabam sendo engraçadas, e outras informações interessantes estão escritas no jornal, como sobre o estado atual do circo e sobre o que está acontecendo em Londres.
Graças às notas de jornal, texto nas telas de carregamento e outras informações, você realmente acredita que tal circo existiu na realidade. Eu confesso que antes de escrever esse texto, fiz minha pesquisa, e não, ele não existiu de fato.
Uma chuva de informações em um jogo charmoso
A quantidade de variáveis é incrível nas primeiras horas de jogo, os inúmeros tutoriais que nos são apresentados logo de cara, apesar de serem em grande quantidade, são bem espaçados. Mas mesmo assim, os desenvolvedores perceberam isso e sempre nos alerta de ir buscar no glossário alguma informação que possamos ter deixado passar.
E isso é só o básico, pois sequer falei sobre uma tonelada de recursos que a trupe encontra em sua aventura após as duas primeiras horas de aprendizado do jogo em si, como sistema de fixação de personagens (eles podem construir relacionamentos e receber bônus) e outras coisinhas que o jogador mais hardcore do gênero vai adorar mergulhar.
Apesar de parecer muita coisa, repito: essa quantidade de informação não é difícil de entender, e ao chegar no meio da história Circus Electrique não adiciona nada de novo a oferecer no que diz respeito a sua mecânica.
Quanto à parte gráfica do jogo, aqui está algo que notei um pouco de desequilíbrio. Se por um lado, o estilo gráfico do cenário em tons sombrios enfatiza a atmosfera da Londres vitoriana, que passa por tempos difíceis. Por outro lado, os modelos de personagens 3D se mostraram bem fracos. Principalmente porque apesar de existir muitos personagens, o que difere um dos outros são apenas o nome ou algum acessório. Ou seja, o palhaço sempre será o mesmo palhaço, o brutamontes sempre será o mesmo brutamontes, e por aí vai.
Vale a pena?
Circus Electrique é visualmente muito atraente no que diz respeito ao seu cenário e ambientação e é bastante desafiador e complexo se for jogado na dificuldade média ou alta. Os fãs mais hardcores de simuladores táticos de combate e gerenciamento por turnos vão adorar o novo título da Zen Studios, enquanto jogadores casuais ou recém-chegados a esses tipos de jogos podem ter dificuldade.
É claro que este foi um trabalho de amor para os desenvolvedores e certamente é um dos jogos mais inusitados lançados no mercado este ano. Se os arquétipos vitorianos do Steampunk e a jogabilidade desafiadora são coisas que lhe agradam, Circus Eletrique vai lhe fisgar rapidamente.
Apesar de alguns tropeços, eu não posso deixar de recomendar Circus Electrique. Poxa, pensa aqui comigo: onde mais podemos desenvolver nosso próprio circo e, entre as apresentações, mergulhar em complexas batalhas táticas por turnos, onde um palhaço gordo e um homem forte estão espancando os policiais perturbados e com o objetivo de varrer a dose de mentiras agressivas de Londres?
O estúdio realmente foi corajoso e conseguiu desenvolver um jogo competente. Dito isto, Circus Eletrique é um jogo feito não apenas para fãs de roguelikes tal qual Darkest Dungeon, mas também para todos que estão em busca de algo incomum.