Housemarque é uma desenvolvedora finlandesa e fábrica de hits como Dead Nation (twin-stick shooter de zumbis no PS3), Super Stardust HD e outros menos referidos como Nex Machina, Matterfall, Alienation e Outland. Porém, meu game favorito é o Resogun, ironicamente o melhor jogo do lançamento do PlayStation 4.
Ironicamente porque assim como muitos outros jogos de natureza arcade que a Housemarque fez, Resogun não é diferente, e, um jogo de natureza tão simples, mas viciante entrar para a história de um doas consoles mais bem sucedidos da história, não é para qualquer um.
Não que Returnal seja a primeira tentativa da produtora em fazer um jogo mais tradicional, que alimenta as mentes famintas do jogador moderno, mas depois de poucas horas com o título exclusivo do PlayStation 5, eu percebi que praticamente todo o molde arcade que acompanha o estúdio desde sempre está presente ainda no lançamento.
Mãos às sensações
Os dedos ficarão nervosos no controle e as mãos armadas como aranhas abraçando o DualSense de modo a ter acesso rápido a todos os botões de ação que o jogo requer. A nossa disposição, neste shooter em terceira pessoa, temos um agradável dash para qualquer lugar desejado, inclusive entre pulos – e esses vão ajudar na sua jornada entre esquivas de ataques mortais dos bosses ou em sessões de plataformas com ornamentos com ‘lasers’ perigosos.
Temos um belo uso do novo controle da Sony, que além de trazer vários micro-batuques internos para simular toda sorte de acontecimento. O meio gatilho, apertado, que significa a sua mira precisa. Já o gatilho empurrado até o fim significa o tiro secundário e forte, que precisará de um tempo para recarregar. Essa convenção pode deixar nós jogadores mais nervosos e não precisos na hora de enfrentar chefes, pois é preciso ter uma frieza para não errar a profundidade do botão L2.
Para isso, o botão dá uma travada de leve no ponto desejado, indicando que você está onde queira: mirar com precisão. Se você insistir no botão mais fundo, o jogo libera e entende o que mais você quer daquele botão. Isso me trouxe a realização de que os dois gatilhos do DualSense agora podem ser só entre eles, 4 botões. Ouso dizer que num futuro breve algum jogo introduza mais níveis de ações num botão só.
Pular, dash, mirar e tiro compõem o repertório básico de um shooter em terceira pessoa com muita ação. Em Returnal é preciso ter noção total do ambiente em que se está, pois, assim como Doom em seu reboot, por exemplo, é imprescindível que a mobilidade seja uma de suas melhores defesas.
Depois de vagarosamente explorar o ambiente, o jogo me priva de prosseguir colocando um inimigo muito mais ameaçador no caminho. Mas calma, isto faz parte dos planos. O jogo está louco para eu morrer a primeira vez para me mostrar sua mecânica mais chamativa.
E caso você não saiba que mecânica é essa, bem, Returnal é sobre morrer e retornar ao seu ponto de partida. Sem piedade, sim, do começo do jogo. A cena inicial de sua nave caindo neste estranho e inóspito planeta cada vez mais é resumida e seu personagem cada vez mais aceita o que está ocorrendo ali.
A minha própria morte é reconhecida pelo meu personagem, minha ferramenta de caminhada pelo jogo. Nesta brincadeira, o jogo também vai gostar de enviar notificações sobre como seus outros amigos morreram em algum ponto do mapa.
O jogo utiliza também outro recurso muito famoso na geração que se passou: a variação na geração de um mesmo mapa. Notei que não é totalmente aleatório, mas mais parece uma coletânea de lugares preparados artesanalmente. De qualquer forma, a ideia é de que essas coleções se misturam da forma mais picada possível de run em run.
Levando o roguelike para as massas
Infelizmente quem tem unicamente uma plataforma PlayStation não teve a oportunidade (ainda) de jogar um dos melhores jogos de 2020: Hades. Returnal tem uma incrível semelhança com o game da Supergiant Games. Não deixe te enganarem com o papo de que o game se parece com um jogo Metro id, só pelo fato do tema se parecer bastante e a protagonista ser uma mulher.
Assim como em Hades, você está relegado a passar de “sala” em “sala”, escolhendo entre portas que podem levar a melhorias de equipamento, ou ao chefe daquele “mundo”. Algumas salas ficarão trancadas assim que você entrar e só reabrirão quando todos os inimigos são derrotados. Muitos itens pelo caminho são estranhos e a personagem irá examinar a fim de obter a descrição de cada um deles.
Porém, o mais importante de se dizer sobre a relação de Returnal com itens e habilidades é que muitas vezes – mais do que o normal, você vai estar lidando com benefícios que também trarão algum tipo de desvantagem como forma de condição para poder usufruir a parte boa. Existem baús amaldiçoados, fonte de recursos que estão amaldiçoados, e parasitas que grudam no braço de Selene. As estéticas mudam, mas o mais importante é saber sempre renunciar a algo ou jogar numa linha mais perigosa de modo a ter outra coisa boa rolando.
Não existem balas para as armas – basta esperar um resfriamento e você está pronto para mais uma rajada. De novo entro com a importância de usar o cenário por vezes, como escudo enquanto a sua arma recarrega.
Falando em cenário, alguns contém plataformas com abismos em volta, então no frenesi de tiros é preciso às vezes ter cuidado e confesso ter passado alguns momentos de raiva por sempre cair e o jogo, para piorar, me devolve na beirada de um novo precipício. Por sorte, cair num precipício não te mata de ver, mas sim tira uma boa parte da energia de Selene.
Os itens são representados principalmente por fortes cores quando o inimigo dropa. Itens verdes significam algum tipo de cura, vermelhos são armas dropadas. E temos outras cores para parasitas e melhorias de armas. Confesso que isso ajuda a empobrecer um pouco o mundo, pois parecem objetos que não pertencem àquele lugar e não possuem nenhum tipo de “personalidade”, se podemos tratar um objeto assim. Afinal, existe um certo misticismo em achar coloridos sanduíches em latas de lixo nos antigos beat ‘em ups.
Os inimigos que mais parecem auras negras com brilhos fortes mais parecem entidades mágicas que não estão exatamente ali do que inimigos com revestimento e algo que você acredita que tenha vísceras, revelando cada vez mais a natureza arcade e talvez meio boba daquilo tudo. Alguns inimigos aqui e ali porém, tem uma representação que impõe respeito naquele mundo. Por isso, posso dizer que a qualidade de design dos monstros pode variar.
Por sorte, ao menos há uma variedade interessante de inimigos, acima da média dos jogos modernos, pois hão 6 biomas diferentes no jogo e basicamente cada um representa uma mudança de tom de cor quase total. A mudança do primeiro para o segundo bioma é gritante, pena que os restantes não possuem um impacto semelhante, pelo fato de serem sempre paisagens soturnas.
É o tipo de jogo mono tom, embora haja uma mudança física das cores. Isso deixou o jogo um pouco cansativo, mesmo porque, se eu não citei nada da história até agora, é porque ela está em doses muito tímidas, escondida nas entranhas do jogo, podendo passar completamente batidas.
Existe, por exemplo, uma casa terráquea no meio do mapa em algum momento. Trata-se da casa de Selene, e ela não pode entrar. Não antes de achar a chave no cenário. Ao entrar você passa a ter vagos ‘flashes’ da vida pessoal dela, num jogo que agora se torna uma espécie de PT, em primeira pessoa, entretanto sem o terror.
E não, Returnal não traz nenhum categoria de terror, só o terror de chegar longe e morrer no chefe, que será facilmente o momento mais tenso e, em simultâneo, divertido do jogo. Essa mistura de emoções pode imprimir também momentos de frustração, já que mais uma vez, digo, que se você morrer, você assiste um resumo da primeira cutscene e recomeça com pouquíssimo de sua jogatina anterior.
Existe agora mesmo na internet essa reclamação de que Returnal deveria ter um save game no meio do mapa e isso não tem o menos cabimento. Não penso que desconfigurar a natureza do game esteja nos planos da Housemarque, mas se ela criar um modo separado para fãs de jogos da Sony que desta vez foram pegos de surpresa por não ser mais de seus jogos de ação vistos do ombro habituais, ela pode ficar a vontade.
Notei, contudo, que ao retornar ao mapa refeito, algo estava facilitado, no modo com que as salas estavam posicionadas, principalmente se eu morri anteriormente para o chefe revelado daquele bioma. É como se o jogo recomeçasse e ele sutilmente colocasse a porta para o chefe tão logo e, em simultâneo, oferecesse outras rotas para tentar o ‘upgrade’ efêmero.
Antes de correr pro abraço
O que se pode tirar disso tudo é que não se deve correr para Returnal como se ele fosse o jogo de forte narrativa, com desafio cabível a todos. Returnal é desafiador, mas não chega ser nem de perto difícil como tantos outros jogos feitos para o jogador hardcore, ele impõe uma pressão sim, mas que será rasgada tão logo que o jogador começar a ficar abusado e se sentir em casa com os trejeitos de sua movimentação e padrões dos inimigos.
Senti também que as armas não exercem grande diferença, mesmo que só se possa carrega uma por vez e isso possa parecer um pesadelo que não conversa direito com a mecânica de loot, o que não tem nada a ver uma coisa com a outra, no caso.