Parte do apelo de Scorn se baseia em estar perdido em vários sentidos, sentidos literais. Sons, lógicas e imagens. Se os objetos dos quais manipulamos no jogo fossem distinguíveis como os objetos que temos em nossa realidade, em nosso planeta, seria feita uma assimilação imediata, e o jogo não quer isso, pois isso além de cortar muito do apelo, corta em grandes proporções a duração do jogo, que já é diminuta.
Diminuto é Scorn não só por causa de suas belas curvas grotescas, mas também no senso de desesperança e surrealidade, que é extremo. Sinceramente, a morte seria algo muito mais interessante do que estar na carne pulsante de nosso sistema aqui persistente e andante. Portanto, se faz necessária sua duração sem exageros, para que os infernos sejam consumados enquanto frescos.
Mas voltando ao assunto de assimilação de elementos globais em jogos, Scorn me fez lembrar a crítica de muitos a jogos como Death Stranding, onde não temos itens manuseáveis tão reconhecíveis de imediato, como as armas de fogo. É que as vezes tenho a impressão de que certa parcela de jogadores torce o nariz para coisas engraçadas de se pensar.
Por exemplo: Oras, para quê reclamar de um jogo dizendo-se que este é chato só porque não se tem armas de fogo, quando na verdade o protagonista possui uma banana que atira amendoim e funciona da mesma forma que uma arma de fogo? É porque muitas pessoas ainda estão muito romantizadas por assimilações visuais, alegorias estabelecidas ao longo deste segmento cultural e, neste caso, cirurgicamente, às skins.
Mas temos também variações, como a reclamação em cima de jogos que não tem botão de pulo, quando na realidade, todo o level design é construído para uma pessoa que de fato não pula, para que o propósito das outras movimentações seja bem realizado dentro deste mundo estabelecido.
Onde quero chegar com isso é que, é preciso hoje se desgarrar de convenções visuais estabelecidas, de dizer que é ridículo achar um frango assado dentro de uma parede simplesmente porque na vida real isso não é normal. Abrace o imaginário e suas reformas de lógica.
A comparação do pulo vai servir bastante aqui em Scorn também, porque o seu personagem possui uma arma com projéteis, mas ela não vai funcionar como uma arma de Call of Duty. Na verdade, será um cenário precário, afim de servir a precariedade geral em que tudo se encontra e para exercer a miséria e horror de se jogar sentindo-se que está o tempo todo na beira do barranco e na última centelha de vida.
E de novo outra coisa é subvertida no jogo. A energia que você pega para se recuperar dos ferimentos, serve na verdade para te colocar em estado normal para quase que imediatamente entrar de novo em estado de miséria. O game design quer te ver passando por 5 horas em rastejo, e não de um ser totalmente capaz. São horas de mau estar, como suas lembranças da turvidez, daquela vez que passou muito mal em casa ou na rua.
Se você não é capaz de absorver esses momentos e sair com essa sensação, eu diria que Scorn falhou como obra para você, e isso não será difícil de acontecer, afinal, tudo depende de como o jogo é vendido comercialmente, pois isso pode influenciar na forma com que você consome e até equipara com outros jogos – normalmente será um erro, consequentemente.
Friamente falando, Scorn é uma espécie de walking simulator com temperos de puzzle em cima, seguido de leve aroma de combate, isso para que a jogabilidade base não se torne monótona. Mesmo assim, para muitos, mesmo com esses temperos, o jogo ainda parecerá monótono, pois muita gente pode estar esperando algo mais frenético, aproximado de Doom, e eu entendo – fazer essa relação seria fácil, já que a campanha de marketing não soube ou não quis explicar exatamente o que ele mesmo é, ao longo desses anos sendo mencionado e mostrado em trailers.
Scorn se encontra disponível nas plataformas PC e Xbox, além de estar disponivel no catálogo do serviço Xbox Game Pass em ambas as plataformas. Este review foi desenvolvido através do jogo fornecido pela produtora.