Skinamarink é uma obra que tende a causar uma série de opiniões divisivas. O que é bom, por sinal, visto que permite com que o filme se coloque no centro de algumas discussões: sobre si, sobre a produção, sobre certa inovação ou outras coisas. Filme de horror canadense de cunho experimental e indie, o longa-metragem, ainda que possa ser considerado enfadonho por muita gente, não pode ser tomado como uma obra clichê.
De certa forma, Skinamarink abraça uma série de subgêneros e inspirações em outros filmes mais famosos e não repousa em nenhum. Ponto para a obra. Temos o caso, por exemplo, dos filmes found footages (filmes achados: Bruxa de Blair, Cloverfield, a franquia V/H/S e muitos outros), ele não é um found footage.
Roteirizado e dirigido por Kyle Edward Ball, que certamente assinará novos e maiores projetos após Skinamarink, o longa-metragem inicia sua trajetória no ano de 1995. Tal decisão o situa antes de muitas tecnologias da informação e comunicação, tornando ainda mais difícil com que o filme possua uma iluminação mais artificial e mais clara por conta do brilho das telas de smartphones, tablets e outras tecnologias touchscreen. Com isso, tudo que vimos – ou melhor, não vimos – faz parte da história que se quer contar.
Falando em história, a obra é bastante econômica em relação ao roteiro. Todo o filme, desconsiderando toda a mítica que envolve certos trechos da história, se passa em uma casa e envolve, em geral, apenas quatro personagens. Dos quatro personagens, dois possuem mais destaque, maior quantidade de falas e tempo de tela, que são as crianças Kaylee e Kevin.
Tanto a garota Kaylee (a atriz Dali Rose Tetreault), que aparenta ser mais velha que o garoto Kevin (o ator Lucas Paul), são nossos guias e faróis pelos acontecimentos que perpassam o filme. Do pouco que ficamos sabendo, é que existe algo que está deturpando o clima daquela casa e que as crianças, aparentemente, não foram afetadas. Por conta disso, o pouco ou nada do que elas sabem e ficam sabendo é também o nosso mesmo conhecimento do que ronda a casa.
A fotografia de Jamie McRae realiza aqui um trabalho severamente importante por vários motivos. O filme, antes de tudo, foi pós-produzido para parecer com um found footage sem sê-lo, como falado anteriormente. Assim, em todo o tempo, o que estamos vendo é algo que se assemelha a uma gravação em VHS bastante caseira de uma câmera com um filtro fortemente granulado, não tão sofisticada e mal operada por “quem realiza” a filmagem.
Quase nunca estamos verdadeiramente cientes do que ocorre em cada enquadramento. Quando visualizamos Kaylee ou Kevin, vemos seus pés ou parte das suas pernas. Mesmo assim, com certo distanciamento. Noutros momentos, vemos figuras de costas, como a mãe, ou objetos sendo manipulados: telefones, brinquedos, portas, luzes, etc.
Em Skinamarink, nada vem fácil. Nem mesmo o título, que faz referência a uma canção de ninar escrita em 1910 e famosa na América do Norte, cujo título original pode ser tanto Skidmarink como também Skinnamarink, com uma consoante diferente ou a mais em comparação com o título do filme. Curiosidade: há uma versão nacional para a canção. Na voz de Xuxa.
Além disso, por não haver uma história sendo desenvolvida de forma mais habitual, o filme desafia o espectador a ir montando o seu próprio desenrolar dos fatos. Contudo, para quem estiver mais atento e conseguir casualmente unir certo acontecimento no início com algo do desfecho, certamente obterá mais pistas para entender mais e um pouco melhor sobre o que Skinamarink pode ser e está tentando nos contar.
Afinal, com exceção dos erros e incidentes de filmagem, nada no audiovisual é gratuito ou simplesmente jogado em cena. Cada cena é roteirizada, as posições do elenco, a maneira como a câmera opera, a luz que incide ou não sobre as atrizes e atores, os objetos de cena e tudo mais. E se o filme em questão prima pelo obscurecimento da fotografia, acreditem, não é mera decisão estilística para baratear custos de produção – embora também o seja, reforço. Há toda uma camada de roteiro que poderá desabrochar na frente de quem conseguir se ater às pequenas dicas visuais ou aos poucos diálogos travados em cena.
Graças a um efetivo crowdfunding, o longa-metragem obteve 15 mil dólares de financiamento, câmeras emprestadas da Film and Video Arts Society of Alberta e as filmagens aconteceram na casa em que o diretor cresceu, no Canadá.
Para quem gostou do filme e deseja conhecer melhor o trabalho do roteirista e diretor, seu canal no YouTube, o Bitesized Nightmares, é um ótimo começo. Nele, Kyle Edward Ball filma os sonhos e maiores pesadelos das pessoas que enviam sugestões para ele. Ao assistir alguns dos vídeos, percebe-se que muito da logística visual de Skinamarink e do modus operandi do seu diretor podem ser apreciados no Bitesized Nightmares.