Confesso que fazia um certo tempo que não parava para ver uma série e ficava tão imerso, tão preso nas sequências de episódios, quase que de maneira hipnótica, acho que a última vez foi quando visitamos Hawkins ainda nesse ano, ou quando a crise existencial pousou enquanto assistia Ruptura.
Mas The Bear (O Urso) chegou de maneira rápida e como a primeira garfada em uma excelente refeição, explodiu minha fome de algo para ver enquanto aproveitava um dia de folga, uma série tão incrível, com temas pesados e outros mais leves, de fato um programa para todos os gostos.
Sim, chef!
De tantos temas que essa série poderia ter escolhido, creio que nenhum outro traria tanto conforto para conduzir os demais dramas, os galhos que surgem no decorrer da série combinam e dão certo significado quando juntos do assunto culinária, isso se a gente quer realmente sentir e porque não dizer, saborear, um programa que traz temas tão pesados, e outros que puxam certos indivíduos para baixo por puro orgulho.
Ao conhecer o assunto principal e saber que iria acompanhar uma equipe de cozinha nas rotinas de um restaurante à beira do caos, me identifiquei de imediato, trabalhei por anos em um restaurante, e a atmosfera ainda é familiar, como se pudesse sentir novamente o calor dos fogões industriais.
Carmen, interpretado de maneira brilhante por Jeremy Allen White, é um chef de grandes restaurantes, aqueles que montam quantidades questionáveis de comida e servem para pessoas com certo poder aquisitivo.
Agora, longe do glamour e tendo que gerenciar o restaurante focado em sanduíches de carne italiana, negócio herdado após o suicídio de seu irmão, Carmen precisa superar não só as dívidas deixadas para trás como uma equipe problemática.
Em uma primeira cena, temos uma das grandes metáforas da série, o urso, uma fera indomável habita o íntimo do jovem chef, não só como algo que o ameaça, mas como algo que pode deixá-lo mais forte, caso aprenda domar a fera.
Fera que simboliza talvez seus sentimentos reprimidos, não demora para perceber que o novo dono da loja tem inúmeros conflitos internos.
É como se a série jogasse isso em tela o tempo todo, ao voltar para seu local de origem, ele terá que lidar com seu passado, o mesmo que ele negligenciou e fugiu, mas certas coisas não podem simplesmente sumir de nossas vidas, assim como os sentimentos do novo chef, o restaurante é desorganizado, com coisas que deveriam ser cuidadas com mais atenção.
Eles serão seu novo norte, uma forma de deixar as coisas mais “leves” e ter contato com aquilo que sente tanta falta, e de certa forma busca se afastar, uma família, amigos.
Quando estamos assistindo os episódios, que com exceção do último, são curtos e passam rápido demais, mas o que nos prende não é a rapidez em terminar a obra, mas sim um personagem mais interessante que o outro, seja o chef, ou seu primo Richie, todos são carismáticos ao extremo, e com arcos interessantes para que possamos entender a motivação de cada um, uns terão maior desenvolvimento do que outros, mas acredito que em uma nova temporada mais seja mostrado.
Os amargos da vida
Assim como na culinária, alguns alimentos não agradam todos os paladares, uns são amargos, outros saborosos, porém, diferente da vida real, podemos escolher o que iremos provar, seria muito bom poder negar tudo que não nos faz bem, e esses amargos chegam de uma forma inevitável, a série mostra uma pessoa que provou e ainda sente o gosto acre que a vida trouxe, seja por seu convívio com profissionais abusivos, seja por ter perdido de maneira tão repentina alguém tão querido.
A forma como os episódios vão, de forma gradativa, arrumando a bagunça na casa, e o ambiente caótico dá lugar uma organização minimamente aceitável, organização essa que se reflete aos poucos no próprio Carmen, aceitação, vontade de mudar, encarar as mazelas desse mundo.
Os capítulos são em minha humilde opinião, impecáveis, cada um com arcos fechados e subtramas que não atrapalham e não dão tédio, são quase que um todo, mesmo que claramente não seja, creio que elementos como os mafiosos do bairro serão utilizados em algum episódio futuro.
Com destaques para o último episódio, que traz a maior carga dramática e a resolução do que foi apresentado na temporada, e finaliza com um gancho sensacional (mesmo que a vontade de ter mais oito episódios fique) é uma direção fabulosa, que junto das atuações será capaz de ganhar fácil os espectadores.
Outro ponto que me agradou, e aqui faço uma pontuação bastante pessoal, foi a trilha sonora, digo isso pois é composta em sua maioria por rock, e são certeiras tanto em finalizar os episódios, como para acompanhar as atividades malucas do ambiente de trabalho.
E não poderia deixar de citar o que para mim é o melhor episódio da temporada, o sétimo, onde temos 20 minutos de um plano sequência, mas isso nem de longe é o que mais me chamou atenção, mas sim em como que ele explode na tela em uma loucura quase que palpável, aqui todos os atores brilham, mas Jeremy Allen dá um show, é uma confusão divertida de se assistir.
De conflitos internos, para aceitação de que todos podemos ser melhores, passando levemente pela comédia e entregando um desfecho com gostinho de quero mais, essa série merece ser vista e apreciada, recomendo fortemente.
Já considero The Bear uma das grandes séries do ano, e um dos meus programas favoritos de 2022, por mais que seja sobre assuntos pesados, ela no fim nos guia para um desfecho leve e alegre.
A série já foi renovada para uma segunda temporada, o que é uma maravilha, os oito episódios da primeira temporada estão disponíveis no serviço por assinatura Star+.